-Alô?- Ele atende do outro lado, são três e quinze da manhã, voz sonolenta.
– Oi, sou eu.- Acendo um cigarro, janela aberta um frio cortante. Me levanto e caminho até a sacada. Vinte andares abaixo, a cidade que não para nunca.
- Oi, que foi?
- Acabei de tomar uma garrafa de vinho
- O que?
- Na tua hora final. Que música estará tocando na curva fatal? Onde você vai estar? Olhando para um teto branco em um quarto cheirando a iodo? Ou numa festa? Qual será teu último desejo? Tomei uma garrafa de vinho. Isso me fez pensar...
- Isso o quê? Olha são três e quinze da madrugada eu estou com sono...
- Isso... O vinho, a cidade lá embaixo. Eu estava pensando onde você vai estar na tua hora final...
– O Que você está falando? Eu estou cansado, preciso dormir, vá dormir também.
- Na hora da morte será que saberemos? O que diremos? Quanto tempo teremos? Eu sei hoje é sábado eu estou meio bêbado, melancólico... Desde que você se foi eu...
- Escuta... Eu preciso dormir, não quero falar disso agora! Eu não estou sozinho... Vá dormir... É tarde!
- Eu só queria dizer que. Eu...
- Eu vou me deitar! Boa noite.
Desliga o telefone. O frio parece aumentar.Tanta gente triste, meu Deus!
Porque é sábado eu estou só.
Você me deixou e eu estou bêbado.
Porque sinto–me vazio e não sei o que fazer sem você, minhas mãos não encontra um lugar, meu corpo não se aquece.
Espelhos partidos.
Sinto o piso frio debaixo dos meus pés descalços.
Vontade súbita de ligar de novo, de pedir para você voltar, me escuta...
Vamos tomar um café agora.
Uma taça de vinho... Venha me cobrir, escuta...
Eu ainda não disse tanta coisa...Nós ainda não caminhamos pela paulista, não tomamos chuva junto, escuta!
Três e pouco da manhã...
Alguns acreditam ser a hora do demônio.
A hora da morte.
A minha hora final.
Um comentário:
Hoje lembrei de um poema lido pela Bethania num show desses que amei, anos atrás.
Lembra algum texto seu, desses que você esquece nas gavetas.
"Eu amo as tuas mãos, mesmo que por causa delas eu não saiba o que fazer das minhas."
Boa tarde!
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