Estou debruçado na janela e penso.
Penso lentamente debruçado na janela no décimo andar.
Que seria bom jogar uma vaca daqui. Como já disse a letra da música.
Acendo um cigarro, me debruço um pouco mais para olhar uma mulher que atravessa a rua.
Seria bom se ela fosse atropelada, se houvesse um barulho, se alguém chorasse, se ela morresse ali na rua dez andares abaixo.
Seria bom que alguma coisa acontecesse no mundo externo
Que algo pudesse tirar de mim este peso na nuca.
Esta coisa amarga na garganta.
Que o mundo lá fora se movesse.
E que por algum tempo estar debruçado na janela do décimo andar não me causasse tanta dor.
Às vezes, em noites como hoje tenho vontade de gritar, esfolar a cara de alguém.
Tenho vontade de chorar.
Vontade de vomitar.
Seria bom sentir uma vertigem caminhar pelo apartamento, cambalear no corredor até chegar no vaso sanitário.
Debruçar-me, abraçá-lo como se fosse um amante.
E depois abrir a boca assim bem aberta e deixar que saísse de mim, esta serpente, negra, pegajosa.
Esta serpente que me corrói por dentro me lança pra fora do mundo.
Seria bom vomitar.
Algo no mundo externo. Um incêndio. Um tiro. Um seqüestro relâmpago.
Se ao menos eu tivesse um binóculo...
Algo que me desprenda
Faça-me esquecer de mim por um segundo.
Esquecer da serpente
Do nó na garganta
Do amargo no peito.
Algo que aconteça lá fora neste exato segundo e me impeça de cair feito uma boneca de pano.
2 comentários:
eu estou no nono
com meus gatos
e meus sonhos enlatados
do quinto andar, muitas vezes a sensação é a mesma.
mas tem também o cheiro que vem da cozinha, miles davis cantando pra mim e os livros na estante.
não é uma vida tão má....
bj, querido.
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